quinta-feira, 10 de julho de 2008

Visto a máscara...


Visto a máscara e corro todos os bailes, mas eles não sabem. Eles não sabem que suas vozes e suor permanecem nas estampas que lhes envolviam os corpos, mesmo neste instante em que os namorados se fizeram conhecer e os risos recolheram-se no sono da embriaguez.

Então sou eu a buscar os retalhos esquecidos nos cantos dos salões. Tingidos de vinho ou sangue, são eles que compõem meu costume.

Parece não ter passado muito tempo desde que recusei meus trajes mais antigos. Tentei vestir o muito leve que são a cor do vento e o som de luas espirais. Permiti que desconhecidas vozes deslizassem sobre meus sentidos enquanto eu permanecia quieta, silenciosa. Não o silêncio de quem cala, mas o silêncio de quem não sabe e precisa aprender.

Aprender que as mãos — as minhas próprias e quaisquer outras — guardam algum segredo, algum encantamento: ainda que cerradas em punho, ainda que voltadas para o céu em completo abandono de prece.

Aprender que os pés sempre tornam ao antigo movimento — o mesmo andar desordenado de quando criança — apesar de o ritmo mostrar que, para além do mal, a vida e o desejo também são motrizes de mim.

Silêncio de quem acreditou nascer, em algum corpo de amante, o beijo que fizesse não mais pensar em infinitos e eternos sobre os quais, de fato, nada sei dizer.

Não estive sóbria naquelas manhãs; mas a fuga aos sentidos era necessária e esperada enquanto houvesse vestígios de tantas festas.

9 comentários:

Lomyne disse...

Ai, que não largo minha máscara nem a pau. Minha defesa e fortaleza...

Anônimo disse...

Vestir a máscara é tão inevitável quanto contrair o rosto ao se chupar um limão bem verde. (Que coisa, não? :p)


Você escreve, mulher.



Abraço.
 

marcela primo disse...

§

Lomyne, T.,

Eu penso sempre na Morte (a irmã de Sandman, de Neil Gaiman).

Uma vez, a cada século, ela toma a forma humana para sentir o gosto da mortalidade e ter uma dimensão maior de sua missão.

Penso que também seja maravilhoso o exercício da nudez de alma, pois o peso das máscaras e das vestimentas sob as quais nos escondemos, muitas vezes nos fazem curvar e sucumbir.

...

§

H. Henrique disse...

:O

Deprimente Má!
Aquele tipo de depressão em que se cai quando a vida boêmia cai em decadência. Triste, denso. Guardando recordações de coisas de jamais voltarão a ser as mesmas.

Melancolia ultra poética!

Tocou fundo!!!

Unknown disse...

Mascara, sempre temos uma...
Ao vesti-la srta. Marcela temos força...

Mas ao tira-la pra respirar quase morremos de desgosto...

marcela primo disse...

§

Nossa, Gu!
Você achou deprimente?
Eu achei tão digno.
Uma coisa de aprendizado, de recolher experiências com ou sem máscaras... embora as imagens estejam tomadas por odores acres (e isso me faz lembrar de outra irmãzinha do Sandman - a Delirium) e cores difusas, o conceito não me parece de decadência, pelo contrário.
Mas eu queria muito que você me falasse mais sobre isso, de como você construiu suas impressões.

Beijo.

§

Ah, Dri...

Penso que as decepções fazem parte da vida.

O "quase morrer", em geral, não está ligado aos outros e ao mundo, mas ao que temos dentro de nós.

Beijo.

§

Anônimo disse...

Oi meu amor,
Vc recita Drumond, Vinícius e eu do alto da minha ignorãncia acho tudo lindo e enebriante. Vc se usa da minha ignorância para me deixar a cada minuto mais viciado em vc e no seu saber. Só quero te lembrar que vc lê e escreve poemas e que eu os vivo! Cuidado para não esgotar o vocabulário tentnado relatar o que sinto por vc......Até pq ´é simples:
Simplesmente TE AMO!
PS: Mas de que modo einnnn................................

marcela primo disse...

§

Não tenho medo de esgotar o vocabulário, porque sempre haverá novo modo de combinar as palavras e prosódia diferente para dizê-las.

E não era você quem, ainda ontem, cantava comigo?

"Sei que às vezes uso palavras repetidas
Mas quais são as palavras que nunca são ditas"

No mais, quando distante o abraço, há sempre que se dizer um "olá". Quando ausente o beijo, precisamos (sempre) compartilhar o silêncio e, nele, nos fazer mais unidos.

§

H. Henrique disse...

Minha parte Mrs. Dolloway se identifica muito com esse texto!

Quero ele pra mim!