... sonhei com você
só
assim
pra te ver...
No alpendre da casa caiadinha, olham pra além do terreiro e do cercado. A mulher pragueja a geada que matou o pasto da criação. Coisa do dianho, deveras! O homem resigna-se a consolar a esposa: tende fé! Que Deus é bom, mas o Diabo também não é má pessoa.
final de tarde
garoa cai
a luz se esvai
o peito arde
vontade te ver
mais perto, esquecer
o errado e o certo
ser toda deserto
entregue ao sol
o meu amor é feito de urgências urgentíssimas!
pressa de te ver me vendo ao teu lado mais um dia;
pressa de nunca acabar as noites de adormecer contigo;
pressa de amar à exaustão e jamais me cansar de te amar e te amar e te amar e te amar e te amar
vem, chuva
pra me molhar
lava minha alma
leva minhas mágoas
vem despertar
a semente guardada
a telha calada
o desejo de amar
rega meu corpo
o ar quente e seco
a planta no vaso
querendo brotar
vem
desagua nestas terras
vem
me enlamear
§
Então... é aquilo:
- o bálsamo não tem um valor místico.
Era preciso tomá-lo nas mãos, passar com cuidado e vigor sobre as feridas e, por fim, mastigá-lo amorosamente, deixando escorrer o sumo entre os lábios.
Mas você o deixou na caixinha, e por certo perdeu a fita negra que a envolvia...
- pode apagar seus escritos, pode apagar seus tantos nomes e mesmo queira apagar sua vida: porém, não apague;
- a mim importa que derramei lágrimas sobre suas mãos trêmulas - ritual de batismo desde o qual e para sempre terá um único nome: AMADO. ------------------- Ainda que recuse ser amigo, ainda que recuse ser amante.
. é isto:
- o bálsamo era o meu corpo.
Mas você o deixou na caixinha...
§
(abril/2006)
Porque quando faz calor e o sol brilha, há o imperativo de ser feliz.
Apenas o céu nublado e a garoa fina nos dão o direito de chorar por mágoas presentes e futuras.
às vezes, a gente pula
às vezes, a gente cai
pode ser um mergulho ou um salto
um tropeço
e tanto maior é a queda
quanto mais se estiver no alto
o fim do orgulho
o começo do fim
a leveza e o peso
um amor que se esvai
— Olhe
vou lhe dizer uma coisa
mas não se acabrunhe, não
não se avexe
não é ofensa o que lhe faço
Tu é, em minha vida, uma moléstia desgraçada
um mal que nem Lázaro há de ter sofrido tão grande
cacei os santos tudin' e nada de alento
simpatia, encruzilhada, reza braba
tu é doença, mulher...
Mas, veja bem,
essa prosa é trova remendada
o que eu vim lhe dizer
e não se aperreie se lhe digo
é que ainda lhe quero bem, visse?
![]() | |
Victoria Abril e Antonio Banderas em "Ata-me!" de Pedro Almodovar. |
"Ah, não acreditas em mim. Pois eu acredito na sua descrença e já penso em como parecer mais verdadeiro, em mostrar dados, fatos; esta aí: minha vida. Mostro-a com minhas duas pequenas mãos. Ainda não posso falar, porque toda essa correria me fez perder o fôlego.
Respira então criança.
Acredito nas pessoas e no poder de revelação delas, daí que surja sempre a desconfiança em mim. Estou sendo correto? - pergunto."
Mateus, O Antigo